Se você ainda não leu a parte 1 e 2 desse texto, leia:
Parte1: Navegando pela primeira vez
Parte2: O Susto
(continuando…)
Parte 3: A emoção do voo solo
O próximo voo seria o último do dia, às 18:15 graças ao horário de verão, pois estamos limitados sempre ao horário oficial do pôr-do-sol. Ao chegar do voo, o Coelho me pediu para verificar qual aeronave estava disponível, ir fazendo a preparação, já ir preenchendo a notificação de voo para que quando ele terminasse nós pudéssemos decolar.
O avião era o PR-EJD, que apenas precisei colocar um pouco de óleo, já que tinha quase 30 litros de Avgás em cada asa, e por fim realizei a inspeção externa. Em seguida preenchi a notificação, levei à sala AIS e na volta já encontrei o Coelho onde fizemos um briefing rápido, afinal não havia nada de novo na missão, era apenas TGL.
Ao chegar no avião, o Coelho percebeu que havia esquecido os fones, voltou para buscar no balcão de operações e me pediu para já ir fazendo os cheques e pedindo autorização para acionamento.
Já fui adiantando tudo, ele voltou rapidinho e conseguimos acionar às 18:28. Saímos no taxi para a pista 18, que é exatamente na cabeceira oposta de onde fica nosso hangar, quando o instrutor disse:
“Olha não é padrão tá, mas como eu sei que você já tá safo, acelera ai no taxi, manda pau pra ganharmos tempo. Acelerando dá pra ganhar 1 TGL”. Toquei gás no bichinho e foi divertido, o taxi que leva normalmente uns 10 minutos, fizemos em 3.
No ponto de espera fiz os cheques rapidinho e já autorizaram nossa decolagem. O sol já estava quase se pondo no horizonte.
Às 18:37 apliquei potência de decolagem. Nossa, quanta diferença! O motor do EJD é bem valente e estávamos com a atmosfera totalmente calma. O avião subiu parecendo que estava sobre trilhos, fora o visual do final de tarde que parecia uma linda pintura.
Fui para o primeiro TGL, tudo normal e ele apenas me deu umas dicas e pediu para melhorar alguns detalhes no flare. E assim eu fui fazendo 4 TGLs, um atrás do outro, melhorando o pouso a cada TGL.
Quando chegou o quinto TGL, na perna do vento ao cruzar o través da cabeceira, a torre me solicitou girar um 360 pela esquerda, pra dar tempo de três aviões que também estavam no tráfego pousarem, e ainda tinha uma no PE pra decolagem. Iniciei a espera e quando estava na metade a torre falou:
“Estamos encerrando nossas operações, temos 4 tráfegos conhecidos no circuito”, e citou o callsign de cada uma em que posição cada uma estava.
A torre de Jundiaí encerra as operações às 19h, após isso vira coordenação. Eu era o número 4 na sequência, ou seja, o último. Alonguei a perna do vento até praticamente o Hopi-Hari e segui pra mais um TGL. O sol já querendo se esconder.
Quando toquei no solo o instrutor falou: “tá comigo!”. Ele livrou a pista rapidinho pela última que já é pertinho ali do hangar, me devolveu a aeronave e falou:
“Me leva até ali no pateo que eu vou descer. Tá confiante?”
Depois de tudo que eu já havia passado, nada mais me assustava. Bora lá! Ao parar no páteo ele me deu umas instruções rápidas do tipo:
“Não esqueça de coordenar tudo, pois não tem torre. Se tiver desalinhado, não pense 2x em arremeter”.
Então ele desceu, me cumprimentou, deu um boa sorte e fechou a porta.
E lá fui eu sozinho, taxiando novamente para a pista 18. Procurei dar uma agilizada de novo no taxi, pois tava escurecendo. No meio do taxi, todas as luzes do aeroporto acenderam, ficou a coisa mais linda. O sol estava aquela bola, que dava pra ver delineada certinho no horizonte, já encoberto pela metade.
Parei no PE da 18, fiz os cheques, chamei na fonia pra saber se tinha mais alguém no circuito. Como ninguém respondeu, dei uma checada na ver se avistava alguém na final ou no circuito, então alinhei e decolei.
E sensação era muito boa, um misto de liberdade, adrenalina e prazer. O tempo estava propício para voar, sem nenhum vento e um visual deslumbrante.
Passando 400ft fiz o After Takeoff Checklist e a 500ft iniciei a curva para ingressar na perna do vento. Antes de terminar a curva eu já havia atingido os 3500ft graças ao belo motorzão do EJD. Na perna do vento reportei a posição e outro avião que vinha pelo o setor W informou que estava de base pra final. Resolvi então reduzir a velocidade e dar uma alongada na perna do vento, girando base assim que ele reportou pista livre.
Ingressei na final com uma imagem que eu vou guardar pra sempre na memória, com aquele lindo visual do pôr do sol e a pista toda iluminada me esperando. Caprichei no pouso, foi um dos melhores que já fiz. Deixei o avião correr a pista, sem pressa pois iria livrar só lá no final da pista.
Assim que liberei a pista, na barra de parada fiz o After Landing Checklist e segui no taxi bem curto. De longe já dava pra ver a galera lá na frente do hangar e o Coelho acenando. Ele me balizou para parar bem de frente. Cortei o avião eles já vieram com um big balde d’água falando:
“Tira celular e qualquer coisa que molha. Esquece o cheque de abando que a gente cuida disso”. rs
Depois de tudo que eu havia passado, aquele banho serviu realmente pra lavar a alma. Então todos vieram me cumprimentar. É realmente um marco na vida de qualquer piloto, não tem como esquecer. Eu estava exausto, pois era quase 20h da noite e eu estava nessa desde as 5:30 da manhã, lembra? O mais importante, é que a sensação de missão cumprida e realização.
Voar sozinho pela primeira vez é uma sensação que é muito difícil descrever em palavras. Uma mistura de prazer, euforia, adrenalina e uma boa pitada de medo. Mas para quem ama voar, vale tudo isso.
Por: Felipe Bachian